Vamos
preparar uma receita. Misturemos artes marciais com um fortão buscando ser o
melhor lutador de todos – o que teremos? Talvez algo como “O grande dragão
branco”. Avancemos. E se, além disso, coarmos o filme até que qualquer
profundidade dos personagens e todo vestígio de boa atuação liquefaça - o que
sobrará? Um filme do Steven Seagal? Contudo, vamos mais além. Acrescentemos
também zumbis, um pedaço tosco de cultura japonesa e um necromante. Batamos
tudo até que vire uma massa pastosa e esquisita – o que estaremos servindo?
Certamente um prato não muito saboroso, porém, nem por isso menos exótico.
Se você
tem estômago forte e estiver disposto a provar, seja bem vindo ao mundo tosco
de “Kung fu zombie”
Lançamento: 1982 (China)
Duração: 80 minutos
Direção: Yi – Jung Hua
Kung fu
zombie
Batendo,
lutando, brigando e... E o que mais?
Tente
fazer o seguinte exercício: pense num ótimo filme, não apenas num filme bom,
mas naquele que tem tantas qualidades - personagens bem constituídos, uma trama
envolvente - que no fim deixa uma torrente de sentimentos dentro da gente,
mudando o que somos definitivamente. Agora avance um pouquinho para um segundo
passo: lembre-se dos elementos que constroem esse filme - a trilha sonora
empolgante, a fotografia charmosa, aquele ator crucial - que fazem dele uma
obra tão incrível. Por fim, o passo final: imagine que o que você está para ver
a partir de agora não tem nenhuma dessas qualidades. Imaginou? Então você está
começando a entender “Kung fu zombie”.
“Filme
de caratê”?
Pang Fong
é um excelente lutador de kung fu pressionado por seu pai para que melhore sua
arte e não caia perante os inimigos do clã. Ele será repetidamente desafiado
por bandidos, zumbis, magia, vingadores e até mesmo por um vampiro antes que o
filme acabe do nada e sem qualquer sentido. E é só.
Marmeladas
“Kung fu
zombie” é um filme bastante simples, ele conta a história de Pang Fong e de seu
principal inimigo, um criminoso fracassado que busca se vingar do lutador
pagando pelos serviços de um necromante desajeitado. Nesse meio tempo há quem
morra, quem ressuscite, quem lute e ganhe, quem lute e perca e a história fica
esquecida num canto escuro das cenas - não anda para lugar algum. O filme se
contenta com inúmeras e intermináveis sequencias de ação e humor físico,
esperando que até o fim delas você fique entretido. Às vezes funciona,
normalmente não.
Bom, mas
e os zumbis? Aparecem somente no começo do filme e depois somem. Apesar disso,
a necromancia tem grande importância para os acontecimentos do filme; tudo o
que ocorre nele é motivado por algum feitiço do mago e pelas tentativas de
vingança que os inimigos do lutador arquitetam. Se essa fosse uma história
inteligente, eu diria que isso é um tipo de aviso do filme, como se a vingança
e os ressentimentos do passado trouxessem somente a morte, e que sempre que são
revividos (ou ressuscitados) é para causar o mal a todos, inclusive quem os
invoca. Porém, como você deve ter notado, não estamos tratando de uma história
inteligente.
Sabedoria
oriental?
Uma
ideia com qual o filme lida é aquela dos limites pessoais. De um jeito ou de
outro todos os personagens do filme parecem esbarrar em seus limites pessoais o
tempo todo, tendo que superá-lo - por meios adequados ou inadequados - para
alcançar seus objetivos. Por exemplo, os criminosos que perseguem Pang Fong
recorrem à magia de um necromante incompetente para obter sua vingança, dado
que só por suas próprias forças não são capazes de vencê-lo; com isso, colocam
seu sucesso nas mãos de outra pessoa, como se fosse possível vencer por si
mesmo com as forças dos outros. Já o necromante se vale de artes as quais não
domina para satisfazer seus mestres, fugindo das consequências de suas ações
imaturas sempre que elas causam problemas. Mesmo o próprio pai e mestre do protagonista
está limitado por seu corpo velho do qual insiste em abusar, forçando-se a
lutar batalhas que não é mais capaz de vencer, mas, sobretudo, pelas tradições
que defende e nas quais busca encaixar seu filho. Ao passo em que tenta fazer
com que o rapaz siga os preceitos antigos, ele todo o tempo descumpre essas
normas, respeitando somente a conveniência da situação. Um hipócrita, claro.
E Pang
Fong, nosso herói?
Bem,
apesar de ser um rapaz festeiro e um tanto imaturo, ele é talvez o exemplo
moral do filme no que tange ao respeito com os próprios limites.
Sendo
chamado ao dever pelo pai, para que treine e melhore seu kung-fu, o rapaz está
sempre dividido entre cumprir com sua obrigação - treinando, treinando - ou
ceder aos caprichos da boemia, bebendo, bebendo. Apesar de não abandonar seu
desejo de sair e se divertir, Pang Fong cumpre com suas obrigações de modo
rigoroso (ou nem tanto) sem levá-las, porém, muito a sério. Se o filme tivesse
um roteiro melhor, seria baseado na descoberta do protagonista de sua própria
força e limites, já que, na medida em que o herói se confronta com inimigos
cada vez mais difíceis, vai se dando conta de que, por anos, seu treinamento
intensivo como lutador o levou a superar muitos limites, até ser capaz de
enfrentar verdadeiros monstros no combate. Sob esse aspecto, Pang Fong é o
equilíbrio, yin-yang; o comedimento que falta aos outros personagens que
pretendem alcançar seus objetivos sabotando a si mesmos. Ao contrário desses, o
lutador deseja, corre atrás de seus prazeres, dá uma escapadinha aqui e ali,
mas treina duramente e se supera sempre, mesmo que só com a maturidade vá
entender o verdadeiro significado de sua força.
Devo
aprender kung-fu?
Ah...
Não.
“Kung fu
zombie” só merece ser assistido caso você – assim como eu, ora bolas – tenha um
prazer mórbido por ver filmes extremamente ruins. Qualquer posição diferente
dessa o levará a chorar por ter perdido oitenta minutos preciosos de sua vida
com um filme horrível.
Particularmente
o considerei bastante divertido. Dá para sentar numa tarde com os amigos, abrir
uma lata de cerveja e rir muito com o que se passa na tela. Os efeitos (não
tão) especiais lembram os bons e sempre clássicos episódios do Chapolim
Colorado. Os zumbis - e em algumas cenas, até os personagens regulares - são
claramente bonecos toscos do tipo que qualquer um pode fazer vestindo algum
material vagabundo com roupas.
Enfim,
não é um filme completamente perdido apesar de se esforçar muito, na verdade, o
começo dele é bem legal mesmo com todos os defeitos que tem. Pense nele como um
prato exótico que só quem tem certo paladar são capazes de degustar. Caso
queira experimentar, desejo-lhe um bon appetit.
Trailer
Tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme tenho que ver este filme...
ResponderExcluirhahahaha, ele é terrível, pensador, tu vai gostar. Poxa, mas é mó raro a gente resenhar um filme que tu não viste. Até que enfim, hahah
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