Hei!
Você que está ai na frente da tela lendo esse blog imundo sobre cinema trash, você
gosta de ficar navegando na internet, né? É, já imaginava. Já fez amigos
virtuais que só conhece por nicks, tipo “GaTiNhO(A) SaFaDo(a)69” , “Anjo do Caos” ou algum
nome elfico impronunciável? Tem entrado nesses sites/fóruns onde pessoas ficam
postando coisas que você nunca imaginou que seriam possíveis? Gosta de acessar
sites como ChatRoullete pra ficar tirando barato dos outros? Acha muito legal ficar
trollando aquela pessoa estranha? Já postou ou fez comentários sem pensar nas consequências que aquilo poderia ter?
Se
você respondeu sim para uma ou mais dessas questões... talvez você já tenha
feito parte de um assassinato =D
Smiley
O sorriso triste
da internet
Antes de começar
a resenha queria fazer um breve desabafo: Smiley não se enquadra muito no gênero trash, mas logo depois de assistir e ver diversos comentários ruins (em muitos
sentidos) me senti na obrigação de escrever sobre ele.
Smiley
foi um filme que me surpreendeu, antes de assistir li (e ainda leio) diversas
criticas negativas, vi-o em listas de piores filmes de 2012, comentários
falando que o assassino era totalmente sem motivação, roteiro fraco, falta de
originalidade, etc. etc. etc.
Enquanto assistia “Smiley” milhões
de coisas passavam pela minha cabeça relacionando o filme com coisas que vemos
no dia a dia da internet. Quando terminou eu me senti triste por ver tantos comentários ruins sobre o filme - será que eu vi muito mais coisas que
realmente existiam no filme (apesar de claras relações e discussões que ocorrem
durante o filme todo) ou as pessoas simplesmente desligam o cérebro quando
assistem a filmes de terror e só se preocupam em liga-lo em filmes taxados como
cult?
Não estou dizendo que a minha
interpretação é melhor nem nada disso, pode ser que esteja errado e seja apenas
mais um filme de bosta. Mas diante de tantos comentários negativos senti falta
de discussões relevantes sobre o filme. Vejo pessoas falando “é um lixo”, “o
roteiro é fraco”, “assassino péssimo” entre outras coisas, mas em nenhum
momento vejo pessoas explicando o por quê, ou se quer tentando compreender o
que o diretor quis passar com o filme...
Concordo
que o filme é fraco em diversos aspectos, mas diante de filmes venerados, como
“Atividade paranormal”, por exemplo, Smiley é uma obra prima.
Título original: Smiley
Lançamento: 2012 (EUA)
Duração: 90 minutos
Direção: Michael J. Gallagher
Duração: 90 minutos
Direção: Michael J. Gallagher
Ashley entra na
sala
Após
ficar sabendo sobre a lenda urbana de um assassino que é invocado através da
internet, Ashley e sua amiga Proxy, “testam” a lenda e acabam matando uma
pessoa. Com o sangue em suas mãos, Ashley começa a acreditar que será a próxima vitima do assassino com rostinho feliz.
Como
boa parte dos filmes do gênero, Smiley começa com uma morte qualquer apenas
para apresentar a lenda e seu assassino. A lenda consiste em: se você está no
chat e um desconhecido digitar 3 vezes para você a mensagem “I did it for the
lulz”, aparece um cara (que tem o rosto em forma de smiley =D) com uma faca
atrás de você e te mata.
A
história mesmo começa com Ashley indo morar com Proxy, uma garota que conheceu
na internet, elas vão dividir a casa por ser mais perto da faculdade. Na
primeira noite elas vão a uma festa (Anonymous) organizada por um dos usuários da área /b/ do 4chan. Lá Ashley conhece Zane (quem organizou a festa), Binder (um
cara que foi expulso da festa por denunciar posts ofensivos no fórum) e acaba
tendo o primeiro contato com a lenda do Smiley quando assiste o vídeo de uma
pessoa ser assassinada pelo mesmo. Impressionada com o que viu, a protagonista
junto com sua nova amiga decidem mandar a suposta “mensagem assassina” pra
algum desconhecido e assim se convencer de que a lenda é apenas mais uma
bobagem. Entretanto não é.
Após matar o desconhecido ela passa
a acreditar que será a próxima vitima de Smiley, mas não sabe se a ameaça é
real ou apenas fruto da culpa.
I did it for the lulz!
I did it for the lulz!
I did it for the lulz!
A nova amiga de Ashley chama-se
Proxy, o mesmo nome utilizado na
informatica pra referir-se a “servidor intermediário , ou seja, proxy é o intermédio entre o usuário e o servidor, ele faz a conexão do computador local
com a rede externa (com isso é possível acessar conteúdos que não conseguiria
normalmente). No filme, Proxy é praticamente a mesma coisa. Ashley no colégio sempre foi “careta”, não saia muito, passava boa parte do tempo estudando, não
bebia e usava drogas, etc. Vamos pensar nela como um usuário que utiliza o
computador para fazer trabalho e coisas simples da internet. Assim que conhece
Proxy, no entanto, ela acaba sendo levada uma festa e lá conhece um “mundo”
diferente daquilo que estava acostumada: bebidas, drogas, pessoas viciadas em
internet, videos de mal gosto e coisas mais, ou seja, uma área mais “hardcore”
da internet.
Proxy serviu como um intermédio entre a garota estudiosa e uma festa de pessoas anonimas da área /b/ do 4chan - uma espécie de fórum para
postagem de imagens e discussões. O site é bastante conhecido por popularizar
boa parte dos memes e também estar relacionado a ativismo. A área /b/ é um
sub-fórum quase sem regras sobre conteúdo postado, quer dizer, há liberdade
para postar quase todo tipo de conteúdo, inclusive coisas de mal gosto.
Algo interessante de notar é que assim como no
fórum, todos na festa, com exceção de Ashley, acabam usando nicks ao invés de
nomes, algo que acaba a expondo mais que os outros. Outra coisa é o nome do
chat que eles usam “HideAndGo” (Esconda-se e vá), ou seja, fique anônimo e
divirta-se, algo bastante comum na internet, onde muitas pessoas só agem de
forma anônima, pois assim se sentem mais “poderosas” e são capazes de fazer
tudo que não fariam com a identidade exposta.
Agora vamos para uma das principais
coisas do filme, o mote “I did it for the
lulz” (“Eu fiz isso pelo lulz). A palavra “lulz” vem da sigla “LOL” que
significa “lot of laugh” ou “laugh out loud” que quer dizer algo como “muitas
risadas”/”rindo muito alto”. É um termo bastante utilizado na internet (games,
chat, fóruns...) para representar risada, zombação Sendo assim, a mensagem “I
did it for the lulz” significa algo como “Eu fiz isso por diverção”/”fiz isso
pelas risadas”. Resumindo: as pessoas matam as outras na internet “for the
lulz”.
O filme tem outras referências
(muitas que eu não devo ter pego), mas essas já são o suficiente para aproveita-lo
e não o tratar como “apenas mais um slasher ruim”.
Diversão virtual e suas consequências
Logo após causar a morte de alguém,
Ashley começa a ter diversos pesadelos bem vívidos com o Smiley e passa a
acreditar que está sendo perseguida pelo mesmo. Assim ela começa a duvidar de
sua própria sanidade uma vez que muitas pessoas se mostram céticas a história
do Smiley, enquanto Zane fortalece a ideia da lenda, deixando-a confusa por não
saber quem está certo. E, também, por ter parado de tomar remédios (para
transtorno bipolar) recentemente.
Até o final da trama ficamos
tentando descobrir se Ashley está louca de verdade ou se realmente Smiley
existe... Ok, o filme é previsível mas vamos fingir que não. Seria possível um
assassino que aparece logo depois de você escrever três vezes a mesma frase em
um chat? Sim, logo concluímos que ela está louca. Mas por outro lado quem nunca
escutou aquela frase clichê “tudo pode ser real se você acreditar”? No filme há
discussões sobre isso.
Durante as aulas da Ashley de
“Introdução a razão e a ética” há diversas discussões filosóficas que
contribuem para o desenvolvimento do filme, entre as discussões encontramos: ideologias,
Navalha de Occam, Principio da entropia, o Mal, entre outras coisas.
Ok, o que esse monte de discussão
tem que ver com o filme?
Smiley se torna real quando as pessoas o tornam real
Não entrarei em todas as dicussões
por dois motivos: 1) ficaria aqui escrevendo eternamente e provavelmente muitos
leitores preguiçosos não leriam 2) não sou nem um pouco qualificado pra falar
dessas questões muito teóricas, mas farei um apanhado das ideias gerais e
tentarei analisar de forma mais simples.
Na internet, assim como no filme,
muitas pessoas acabam adotando a ideologia da “diversão”, melhor dizendo, acham
que a internet é um grande playground, que tudo ali não passa de uma grande
brincadeira e as coisas que lá acontecem não reflete na vida real. Bom,
acontece que nós já estamos cansados de saber que isso não é verdade. Quanta
merda não acompanhamos diariamente por causa da internet? Pessoas cometendo
suicídio, depressão, gente fingindo ser que não são entre outras coisas.
Contudo, por mais merda que aconteça, só cresce a popularidade de humoristas
que fazem fama em cima de desgraças e humilhações e que, quando são chamados a
se responsabilizar por suas ações, apenas repetem: “era só uma piada.”.
O
grande problema é que as pessoas só olham a piada, não vendo a consequência da
mesma, do mesmo modo que no filme as pessoas contemplam a lenda por diversão,
mas não pensam da dor da pessoa que está do outro lado. Me atrevo a dizer que
todos nós (ou grande parte) somos todos mini-assassinos em potencial que
cometem crimes para auto-satisfação.
A
questão é que, às vezes, uma brincadeira que parece inocente acaba fugindo do
nosso controle e tomando proporções muito maiores do que deveriam. Tanto é que
em uma das aulas há uma reflexão exatamente sobre isso. Nossa concepção do
mundo, geralmente, se dá por definições pré-definidas, quer dizer, sempre
pensamos nas coisas como coisas já “acabadas”, nunca consideramos as mudanças que
elas podem ir sofrendo com o tempo como, por exemplo, um organismo vivo.
Pensamos em um animal pelas suas características e pelas coisas que a biologia
nos ensina e, assim, o tomamos como um organismo que está completo e estável,
entretanto, estamos sempre em constante evolução e adaptação. Não entendeu? Ok,
pense em um cachorro, nós sempre o concebemos como um bichinho bonitinho de
quatro patas que adora brincar e morder (destruir) nossas coisa, entretanto não
sabemos como será o cachorro daqui a milhares de anos, afinal somos todos
“vítimas” da evolução. Quem sabe os cachorros não aprendem a falar e escravizam
os humanos? Nunca saberemos.
A internet (e a tecnologia) está
cada vez mais se assemelhando a um organismo vivo, quase tudo que se faz dentro
dela acaba gerando consequências e, de certo modo, tomando “vida própria”. Não
sabemos a direção que essas transformações estão tomando, sendo que poderá ocorrer coisas tanto boas quanto ruins. Uma brincadeira virtual entre um grupo
de amigos pode atingir milhares de pessoas; aquilo que pertencia a algumas
pessoas se torna mundial. Não estou dizendo que as máquinas vão escravizar os
humanos (se é que já não fazem), mas que o computador age inconscientemente...
Será que alguma hora não agirá conscientemente?
Em uma discussão durante o filme o
professor diz: “O mal é produto da humanidade.(...) Pense nas pessoas e no que
elas fazem. Nós somos uma perfeita máquina de suicídio planetário. Tudo que
precisa fazer é dirigir, consumir, começar uma família. Não existem maneiras
mais eficazes para um ser humano acelerar a extinção planetária. Não precisa
fazer nada de espetacular para desempenhas um papel importante no grande
projeto humano de destruição do mundo.(...) Você acha que isso é o mal? Estamos
apenas fazendo o que sabemos, não é?”
Isso
mesmo, você com sua vidinha medíocre é, também, um dos responsáveis por toda a
merda do mundo, mesmo sem perceber.
*
Outra
coisa que o filme acaba mostrando é a indiferença da policia com crimes
virtuais. Geralmente tratam crimes virtuais como coisas que não pertencem a
realidade, principalmente em casos como racismo, bullying e outros que parecem “não valer o esforço”. É
muito mais fácil ignorar do que tentar punir os culpados. O problema é que,
assim como no filme, isso costuma acabar em morte.
Previsivel mas
coerente (Spoiler)
Depois
de tudo que escrevi você já deve imaginar o final do filme. Sim, caro leitor,
tudo não passa de uma grande brincadeira das pessoas do fórum, ninguém morreu
de verdade e apenas criaram um lenda para assustar a nova garota. Mas, como já
disse, às vezes, as brincadeiras fogem do controle e matam alguém de verdade.
Ok, o
final é algo que você já espera. Em diversos momentos o filme dá dicas sobre
isso. Percebemos que o assassino usa mascaras e só em sonhos o Smiley é
realmente um bixo feio, que os amigos que drogavam Ashley entre outras
coisas... Ok, é previsível mas teria como fazer um final melhor e continuar
coerente?
Vi muita reclamando sobre o final ser previsível, porém não consigo pensar em nenhum outro que seja coeso com aquilo que o diretor quis mostrar durante o filme. Prefiro um final previsível, contudo, que tenha sintonia com todo o contexto, que algo surpreendente o qual jogue no lixo tudo aquilo que o filme construiu.
Vi muita reclamando sobre o final ser previsível, porém não consigo pensar em nenhum outro que seja coeso com aquilo que o diretor quis mostrar durante o filme. Prefiro um final previsível, contudo, que tenha sintonia com todo o contexto, que algo surpreendente o qual jogue no lixo tudo aquilo que o filme construiu.
Voltando
para o enredo, após uma morte real ocorrer, todos aqueles que construíram a
lenda continuam levando na brincadeira, tratam como uma vitória do Anonymous
(um grupo de usuários que agem anonimamente geralmente associado a
“hacktivismo”, muitas das suas atividades estão ligadas a liberdade das pessoas
na internet e coisas do tipo, entretanto muitos utilizam do anonimato e da fama
do Anonymous pra cometer crimes virtuais para prejudicar ou se esconder atrás
da sua ideologia) mesmo o grupo não sendo do Anonymous, ou seja, os “Trolls”,
como eles se denominam, são apenas mais um grupo que se aproveitam do Anonymous
em algumas questões, mas não compartilham da ideologia “ativista” e fazem
coisas não para mudar o estado das coisas, entretanto para se divertir (mesmo que
essa diversão seja meio mórbida).
Logo depois da morte alguém fala:
“sendo assim, Smiley também morreu”, afinal tudo foi criado apenas para
assustar Ashley, todavia, a internet é um ambiente onde as coisas não morrem,
elas continuam se propagando e tomando proporções ainda maiores do que deveriam.
Smiley deixa de ser um e passa a ser qualquer um...
“Todos nós somos capazes de fazer os atos
mais horríveis, as mais cruéis atrocidades. Simplesmente fazer algo só porque
você pode fazer. Mas o que nos previne de fazer o impensável? De cruzar a linha
entre a luz e as trevas?
Toda comunidade vive sob um código moral.
E quando esse código se quebra. Deve-se acreditar que algumas forças do
universo são libertadas. Pontos devem ser marcados. Homenagens colecionadas.
Claro... Nunca saberemos com certeza as consequências de nossas ações. Mas de
uma coisa sabemos, com certeza. Todas as ações tem consequências. E na luta
entre o bem e o mal...Nunca saberemos quem vai rir por ultimo.”
Devo mandar mensagens assassinas pela internet?
Não amiguinhos, como vocês já viram,
mesmo não dando pra sumonar um assassino do outro lado da tela, é possível matar pessoas com a internet, então nada de trollagem. Contudo, quanto a
assistir o filme, contrariando 99% das pessoas, eu digo sim. A película,
tecnicamente, não surpreende em nada, apenas segue os padrões de outros filmes
do gênero da mesma época, mas também não tem nada de terrível. Fora isso, a
proposta e as discussões dele são muito bacanas.
Smiley, apesar de ser um “slasher”,
não pode ser visto como tal. Não espere sangue jorrando na sua cara,
perseguições alucinantes ou um assassino que irá virar um ícone como Leather
Face ou Jason. Assista ao filme com a mente aberta, tentando compreender o
significado de cada elemento que está no filme e as reflexões e críticas que o
mesmo faz, até mesmo no nome dos personagens existe algo por detrás.
Infelizmente, Smiley é um filme que
já nasceu morto, um trailer que não parecia trazer nada de inovador a não ser
um assassino que arrancou risos de muitos e com uma proposta que nem todos
compreendem ou sequer tentam compreender. O filme está MUITO longe de ser um
clássico, mas merecia um pouco mais de respeito por trazer uma proposta
diferentes (mesmo que usando milhões de clichês) em uma época tão ruim para o gênero.
Trailer:
Exatamente como você comentou, não busquei assistir o filme por causa das péssimas críticas. Mas gostei tanto da postagem e dos pontos que ela levantou que procurarei assisti-lo.
ResponderExcluirGrande abraço e obrigado pela resenha. 8)
Cara...uma coisa me chamou a atenção no texto...o uso do anonimato!!!
ResponderExcluirTenho um blog, e sempre que recebo críticas severas, elas foram escritas por pessoas que não se identificam...O anonimato protege os bons e o maus...
A harmonia da vida em sociedade exige que a gente siga certas regras, que não devem ser esquecidas no mundo virtual!!!
Ótimo texto, afinal ele conseguiu apagar centenas de comentários negativos que li sobre esse filme, e agora tenho reanimada minha vontade em assisti-lo.
Opa, vlw Pensador e Noite Sinistra. É sempre bom ver que as resenhas despertam curiosidade sobre os filmes escolhidos. (depois que assistirem falem oq acharam do filme) ;D
ResponderExcluirO filme não é ótimo, mas tem umas idéias muito bacanas.
Pois é Noite, o anonimato é um problema, ao mesmo tempo que é algo interessante pra se ter na internet, ele também serve como uma proteção pra que as pessoas façam o que quiserem e não sejam responsabilizadas. Parece que esse anonimato acaba viciando e as pessoas vão perdendo, cada vez mais, os limites. Tem até uma tirinha do Gus Morais que postamos logo depois da resenha, ele aborda isso.
Abraços,
sempre que possível venham tomar uma xícara de Café com Tripas ;D