sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Resenha: Natal sangrento (Silent night, Deadly night)


            Natal passou, já comemos como porcos, celebramos com a família, deixamos para trás todos os problemas, escutamos a piada do “pavê ou pacumê”, comemoramos o nascimento de Jesus ou... Enchemos a cara, fomos uns filhos da puta hipócritas na ceia de natal, mostramos o dedo do meio pro espirito natalino e só nos importamos com o presente, realizamos nossas fantasias sexuais fantasiados de papai (mamãe) Noel, enfim...
            A questão é que natal passou, mas o Café dedicou a semana para o bom velhinho... Que na verdade pode não ser tão bom assim. Deixe o leitinho na janela, coloque uns biscoitos ao lado da arvore de natal e reze, reze muito para ter se comportado bem esse ano, porque o senhor Noel não gosta nem um pouco de pessoas que aprontaram...






Título original: Silent night, Deadly night
Lançamento: 1984 (EUA)
Duração: 85 minutos
Direção: Charles E. Sellier Jr.





Noite feliz, noite feliz… NOITE FELIZ O CARALHO!

Depois de ver seus pais serem assassinados, na véspera de natal, por um homem vestido de Papai Noel, Billy é mandado para um orfanato católico onde não recebe a assistência necessária para superar suas lembranças. Quando adulto, todo o sentimento reprimido acaba tomando Billy, que ao colocar a roupa de Papai Noel torna-se um sádico assassino.

Papai Noel vai trazer uma grande surpresa esta noite!


            Natal Sangrento pode ser dividido em três partes: Infância, pré-adolescênciae adolescência. Boa parte do filme acontece na ultima parte, entretanto as duas primeiras são extremamente importantes para compreender os traumas e motivações do nosso anti-herói.
            Billy é uma criança normal, curioso e cheio de dúvidas. Depois de escutar seu avô (?) falando que véspera de Natal é uma noite aterradora ele começa a desconfiar do bom velhinho, quando mais tarde seus pais são assassinados na sua frente sua imagem do natal passa a ser construída através dessas imagens.
            Crianças comuns são ensinadas que o natal é época de celebração, ganhar presentes do papai Noel, felicidade, entre tantas outras coisas legais, entretanto Billy com seus quatro anos aprendeu sobre o natal de uma maneira nada convencional; enquanto papai Noel pra maioria das crianças representa brinquedos, para ele representa castigo e morte.

PAPAI NOEL EXISTE SIM!

            Logo após a morte dos pais, Billy e seu irmão vão para o orfanato. Anos mais tarde percebemos que natal ainda é uma época do ano que o atormenta, sente medo de papai Noel, faz desenhos que mostram o bom velhinho morto e etc. Entretanto, ao invés de tentarem dar o suporte necessário para que ele supere o trauma e possa continuar com sua vida normalmente, ele é reprimido pela madre superiora, que o castiga por não ser como todas as outras crianças que gostam do natal.
            Uma das freiras tenta ajudar o pequeno Billy e alertar que se nada for feito algum momento o garoto irá perder o controle, mas a madre superiora que detém o poder se recusa a escutar qualquer tipo de conselho. Como ela mesma diz: “Se tiver o treinamento apropriado ele saberá lidar com isso.”
            A questão é que o “treinamento adequado” proposto é o castigar sempre que ele não se comporte como deveria. Billy fica trancado no quarto enquanto todos os outros brincam, é amarrado na cama quando tem pesadelos, é obrigado a sentar no colo do papai Noel mesmo tendo visto a figura do mesmo assassinando seus pais, é punido por coisas que não fez, entre outras coisas. Ou seja, ao invés de ser ajudado, o orfanato reprime todas as suas lembranças além de intensificar seu ódio pelo natal. Mas não é muito estranho esse tipo de atitude vindo de autoridades religiosas, não é mesmo? É muito mais fácil fazer com que as pessoas acreditem em suas verdades do que tentar explicar e solucionar os problemas. É mais simples falar que Jesus vai ajudar do que falar a verdade e se levantar para auxiliar o próximo. É mais fácil falar que Papai Noel é bonzinho e obrigar a sentar no seu colo do que tentar tratar do trauma de uma criança que viu seus pais serem assassinados pelo próprio.


            Billy já estava traumatizado, o orfanato piorou ainda mais suas experiências natalinas e, além disso, o próprio sexo passou a ter uma imagem negativa. Enquanto assiste sua mãe ser morta, ele vê o assassino apalpando os peitos de sua mãe e, anos depois no orfanato, ele vê um casal transando e logo após sendo punidos pela madre superiora. Nosso protagonista está perdido no meio de diversas coisas que não entende: natal, sexo, religião, castigo... Isso tudo o deixa confuso e faz com que ele crie a sua própria concepção de natal: A época em que todos aqueles que aprontaram durante o ano deverão ser punidos; o Papai Noel seria uma espécie de juiz.
            Assim como uma das irmãs previu, uma hora todos esses sentimentos reprimidos de Billy iriam se libertar... Dito e feito.

Mas quando fazemos algo mau, somos sempre descobertos. E depois, somos castigados. O castigo é absoluto. O castigo é necessário. O Castigo é bom.

            Apesar dos natais traumáticos no orfanato, Billy cresceu aparentemente bem. Entretanto percebemos sua doutrinação católica influenciada pelo orfanato. Inocente, não bebe, sente-se culpado só de pensar em sexo, etc. Com seus 16/17 anos consegue emprego no armazém de uma loja de brinquedos carregando caixas, um emprego simples, mas que parece agradá-lo, afinal, é uma forma de sair do orfanato e começar a sua vida.
            Tudo ia bem até o natal se aproximar (ainda mais quando se trabalha em uma loja de brinquedo). Billy parece ter adquirido um autocontrole melhor em relação a assuntos natalinos (talvez por tudo que tenha passado no orfanato), porém percebemos que mesmo 13 anos após o incidente o natal ainda é algo mal resolvido para ele. O jovem não deixa de fazer seu trabalho, mas se sente mal sempre que se aproxima de coisas natalinas.

            Justo nessa época acontece algo inesperado: a pessoa que trabalharia como Papai Noel na loja quebra e perna e não há ninguém para substituir, e isso faz com que sobre pra quem?
            Sim, isso mesmo. Billy acaba se fantasiando daquilo que sempre o assombrou para alegrar (ou não) as criancinhas que vão comprar seus brinquedos na loja. Nem preciso dizer que esse é o momento “FUDEU” do filme, né?

            Tudo parecia correr bem, o nosso jovem Papai Noel amedrontou escutou os pedidos e tirou fotos com as criancinhas, a loja faturou com a venda de brinquedos e quase todos pareciam feliz, mas... A roupa de papai Noel, uns copos de bebida que o chefe faz Billy beber com ele, frases como “Logo, logo, você vai achar que é o próprio Papai Noel” ou “Você sabe o que o Papai Noel faz?”, ver um casal próximo ao coito faz com que Billy encarne o próprio... Mas não o bom velhinho que trás presente e alegria como conhecemos, mas sim aquele que castiga os pecadores, afinal é somente esse que ele conhece.

Freud, Jung e Papai Noel

            Tendo acompanhado um pouco da vida e traumas de Billy, podemos fazer uma análise do personagem com base em alguns conceitos de psicanalise de Freud e Jung. Deixo claro que é uma análise superficial, afinal, não entendo muito. (Se eu estiver errado podem corrigir, prometo que não me fantasiarei de Papai Noel e te farei uma visita com um machado na mão enquanto dorme.)
            Falando de maneira breve, Freud separa o sistema psíquico em três partes. O id, o Ego e o Super Ego. O id seria a parte na qual existem os instintos básicos, aqueles que não possuem juízo de valor, ou seja, seria o instinto, o inconsciente, a busca de satisfação sem se preocupar com as consequências. O Ego seria a “organização do id”, o id modificado pelo mundo externo, o qual equilibra os instintos primitivos do id e a realidade. O Ego busca satisfazer o id de modo realista, trazer alivio a longo prazo e não apenas os impulsos. Já o Super-ego seria o oposto do id, enquanto o id busca a auto-satisfação o Super-ego preocupa-se em agir de forma socialmente correta, o sentido de certo, errado e culpa. Além desses três podemos pensar em outro conceito, estudado por Jung, que se aplica ao personagem do filme, o Alter-ego, que seria um “outro eu” dentro da mesma pessoa.

- Ok, você falou, falou e o que esse tal de Fróyd e Jungui tem a ver com papais Noéis assassinos?

            Apesar de ser um filme trash, Natal Sangrento se destaca quando desenvolve o personagem principal, algo que muitas vezes é ignorado por vários filmes, que preferem compensar com doses de sangue a mais. Acompanhamos Billy da sua infância até o inicio da sua fase adulta, algo que nos permite ter uma melhor compreensão da sua personalidade.


            Quando criança, vemos que o id é uma das “partes” mais presentes em sua psique, ele busca a auto-conservação, não está preocupado se aquilo é socialmente aceito ou não, ele apenas quer ver-se livre daquilo. Ao crescer um pouco Billy continua sendo dominado pelo id quando está sobre pressão, mas logo após o Super-ego toma conta, ele passa a “se auto punir” pois pensa ter feito algo errado e imoral, como exemplo podemos citar a passagem na qual o papai vai visitar o orfanato, quando obrigado a sentar em seu colo Billy acaba socando o nariz do bom velhinho (id), mas logo em seguida sai correndo para o quarto e começa a chorar de arrependimento (Super-ego). Quando crescido, parece estar mais equilibrado, mesmo enfrentando aquilo que o desconforta ele mantem o controle (Ego), pois sabe que é a melhor forma de se relacionar com a sociedade.
            Entretanto, quando coloca a fantasia de Papai Noel o Alter-ego mostra-se presente. Não quero dizer que já existia um papai Noel assassino dentro de Billy, mas é inegável dizer que não existia um sentimento reprimido, relacionado ao natal, dentro dele que poderia explodir a qualquer hora.
            Sendo assim, ao colocar a roupa e ver certas coisas, todo o sentimento reprimido “liberta-se” e toma conta de Billy, que deixa de ser ele mesmo e passa ser um “Alter-ego” repleto de traumas e frustrações, e que se vê obrigado a interpretar o papel de papai Noel que ele conhece - alguém que pune todos aqueles que pecaram.

Devo deixar de ver o especial de natal do Roberto Carlos e me fantasiar de papai Noel para castigar os pecadores?

            Sim... Mentira, você deve ver o filme, mas nada de sair matando os safadinhos (as) por ai, afinal, mundo sem pecadores não teria a mínima graça.
            “Silent night, Deadly night” é um slasher típico, um serial killer que sai por aí fantasiado matando todo mundo que não se comportou direito. Entretanto, ele se destaca por construir o personagem, desenvolver sua personalidade e fazer críticas em torno daquilo que influenciou o mesmo a cometer os crimes (religião, repressão, falta de assistência...), algo simples que o torna melhor que muitos filmes do gênero que preferem colocar mortes a mais que história.
A primeira metade da história é bastante focada na construção do personagem, mas a segunda se preocupa em dar tudo o que os fãs de terror querem: temos peitinhos diversidade de mortes e muito sangue (machado, faca, enforcamento, decapitação...), algo que não pode faltar em um trash que se preze.
Não podemos deixar de citar as qualidades técnicas também: fotografia muito bem feita para o tipo de filme, closes, flashback e cenas quase sempre bem colocadas. A trilha sonora é algo que chama muito a atenção, consegue mesclar musicas natalinas com cenas de violência ou até mesmo tornar as músicas natalinas sombrias. Não digo que o filme é um primor técnico, mas considerando slashers, ele está um passo a frente.
Natal sangrento é um filme obrigatório para qualquer fã do gênero, ainda mais em épocas natalinas. Assista!

 Trailer:


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