“Em 1963 Alfred Hitchcock fez um filme chamado “Os pássaros” mostrando
um ataque selvagem de um bando de criaturas aladas a seres humanos.
As pessoas riram.
No outono de 1975, 7 milhões de pássaros invadiram a cidade de
Hopkinsville, Kentucky, resistindo aos melhores esforços para mantê-los longe.
Ninguém está rindo agora.”
Sim, criaturas noturnas leitoras do Café com Tripas, aprendam
logo duas coisas: vocês não devem subestimar a vida útil deste blog, nem a
periculosidade dos tomates!
Título original: Attack of the killer tomatoes!
Lançamento: 1978 (EUA)
Duração: 83 minutos
Direção: John de Bello
O ataque dos tomates assassinos
Essa doce arte de esculhambar
O ataque dos
tomates começa de
uma maneira bastante sugestiva: depois de contar essa historinha aí acima e
mostrar uma pequena cena de terror (que, já que envolve tomates, não aterroriza
ninguém), exibe os créditos do filme ao som de uma tarantela enquanto tomates
são jogados contra a câmera e – subentende-se – contra o espectador. Na
verdade, esse gesto simples poderia resumir todo o filme: um arremessa de
tomates contra os nossos rostos bonitinhos, almejando informar, logo de início,
que a historinha que ouvimos é balela, que não, sua comida nunca irá se tornar
um monstro assassino, que tudo o que você está prestes a ver tem tanta graça
quanto um vegetal (quer dizer, fruta) sendo jogada contra o rosto de alguém.
Mesmo que seja o seu.
Essa falta de
vergonha ao se assumir como um filme de esculhambação é a premissa sobre a qual
toda a obra está apoiada, sendo que em nenhum momento ela pretende propriamente
ser séria, diferentemente de outros trashs como O império das formigas, por
exemplo. O arremessar de tomates esfrega na nossa cara que até os momentos em
que a obra faz nítidas críticas contra a polícia, a política e outras
instituições, elas são tão reais quanto monstros vermelhos gigantes que matam
pessoas: estão ali para entreter; não sobrevalorize, você não está diante de um
grande filme.
Deste modo, sendo
uma obra que não se leva a sério demais, que só vai ser inteligente o
suficiente para você não se sinta insultado, ela consegue ser um dos trashs
mais coerentes e bacanas já feitos, não se apoiando sobre vulgaridades apelativas,
insinuações sexuais toscas e outras coisas das quais o gênero frequentemente se
vale, porém, ao mesmo tempo, não perdendo o tom exagerado e bizarro existente
em qualquer bom trash.
Arriscando um palpite furado (aliás, como são todos os meus
palpites) eu diria que O
ataque dos tomates assassinos é,
tal como A camisinha assassina e O
massacre do micro-ondas, um dos melhores exemplos do que há de bom no
cinema trash.
Bem-vindos a um tipo de cinema do qual você não vai apenas rir,
mas que também rirá de você.
Tomates assassinos
começam a atacar cidadãos americanos em várias partes do país. Com isso, o
governo quer encobrir a crise, os políticos ganharem com ela, os jornais
vendê-la e assim por diante...
Como é?
Tomates assassinos tem uma
estrutura que condiciona tanto o modo como a história é contada e como de que
maneira as piadas são feitas. É o seguinte: em toda cena, ou em quase toda
cena, algum “gatilho” cênico é disposto no cenário, pode ser o fato de que os
personagens estão numa sala apertada, por exemplo, daí, ocorrerá que as piadas
e o próprio desenrolar da história usem e abusem daquele artifício no seu
desenvolvimento.
Basicamente, o humor filme é construído sobre essa estrutura, de
modo que toda nova cena possui algo notável que chama a atenção do espectador e
determina parte do humor que acontecerá ali. Na verdade, o próprio tomate é
mais gatilho desse tipo mais que um elemento central do enredo, uma vez que,
depois de assistirmos um pouquinho da história, percebemos que não há nenhum
grande mistério por desvendar e, francamente, ninguém liga para o motivo pelo
qual os tomates ganharam vida e saíram por aí atacando os estadunidenses, ou
seja, a humanidade.
O que importa é que boas piadas são criadas nesse clima de
non-sense e bom humor, levando o filme adiante sem que a gente espere muito
dele e, com isso, tenhamos algumas boas surpresas de vez em quando.
Caricaturas
Do começo ao fim Tomates assassinos trabalha com caricaturas. Seus
personagens até tem nomes, porém o que conta para a história não são suas
personalidades, mas o fato de que eles são, sobretudo, jornalistas
investigativos, políticos inescrupulosos, cientistas malucos e outros tipos
caricatos que permeiam nosso imaginário. Assim, como não poderia ser diferente,
toda a ação se dá nos Estados Unidos, país que, como sabemos, concentra a maior
população de psicopatas, cientistas malucos, pessoas querendo apressar o fim do
mundo e, agora, tomates assassinos do mundo. O filme não tem nenhuma vergonha
na cara, como vocês podem ver e tudo isso é proposital.
Como consequência,
o enredo segue diversos caminhos caricatos, toscos, dignos de um roteiro cujo
começo, meio e fim seriam adivinháveis de tão clichê. Em certa passagem, por
exemplo, as “autoridades” (olhem aí mais caricaturas) decidem usar tecnologia
para criar, por meio do auxílio de seus super-cientistas, um soldado perfeito
(Bruce!), que terminará com o problema dos tomates – adivinhem só – na porrada.
Já em outra cena, a censura governamental sobre a mídia tenta encobrir o
problema dos tomates, enquanto pessoas morrem de maneiras bárbaras,
aparentemente impossíveis de disfarçar. No meio disso surgem personagens
inusitados como a jornalista subestimada, o especialista em disfarce que
resolve passar desapercebido se vestindo de Hitler (com um detalhe: ele é
negro) e tantos outros que divertem bastante exatamente por forçarem a barra
dentro de algo clichê, de onde não esperaríamos surgir nada de interessante. Ataque dos tomates acaba sendo um filme feito de
caricaturas, sem personagens esféricos, melhor dizendo, com mais caricaturas
que personagens, repleto de piadas e absurdos divertidos.
O filme consegue
ser tão caricato nos assuntos que aborda – seja política, mídia, crise –, tão
agressivamente falso que, no entanto, só pode pretender revelar a mais pura verdade.
Nesse sentido acho que ele é muito interessante: exagera ao ponto de acharmos
que aquilo não pode ser verdade, só para percebermos em seguida que só pode ser
caricato se levar até as últimas consequências coisas que sabemos existir com
certeza. Aliás, isso me lembra aquela cena clássica de The godfather:
Michael: Estou
trabalhando para o meu pai agora. Ele está doente, muito doente.
Kay: mas você não é
como ele. Disse que nunca seria como seu pai.
Michael: meu pai
não é diferente de nenhum outro homem poderoso. Um homem que seja responsável
por outras pessoas. Como um senador ou presidente.
Kay: como você é
ingênuo.
Kay: Senadores e
presidentes não matam pessoas.
A ironia da obra
(das duas) é que, embora as caricaturas de presidente, senadores e mafiosos
sejam distintas, a realidade deles é bastante próxima; tanto um quanto o outro
recorrem a meios escusos para atingir seus objetivos. Nesse sentido é que Ataque dos tomates é um filme de caricaturas e ao mesmo
tempo bem crítico delas, por mostrar em que aspecto algo é irreal, cartunesco,
e mesmo assim completamente possível ou até atualmente verdadeiro.
Devo colocar
tomates na minha macarronada?
Sim, senhor,
senhora ou senhorita, pois seja lá quem você for, boas macarronadas só são
feitas com tomates bem vermelhos. E se forem tomates mutantes assassinos,
aposto que o gosto sai melhor ainda.
Ataque dos tomates é um filme bem simples e bem gostoso de assistir, o tempo vai
passando e vamos acompanhando o desenrolar tosco dos acontecimentos com um
sorriso no rosto. Ninguém vai engasgar de tanto rir, tampouco sair decepcionado
com o que viu, sendo que a obra está entre os melhores exemplos, a meu ver, do
que seria um bom filme trash: não se leva a sério demais, não deixa de ser
esculhambação pura e inteligente desse mundo podre em que vivemos.
Com isso, o Café com Tripas mais que recomenda O ataque dos tomates assassinos:
vejam sejam felizes.
Trailer
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