quarta-feira, 5 de março de 2014

Resenha: O ataque dos tomates assassinos (Attack of the killer tomatoes!)


“Em 1963 Alfred Hitchcock fez um filme chamado “Os pássaros” mostrando um ataque selvagem de um bando de criaturas aladas a seres humanos.
As pessoas riram.
No outono de 1975, 7 milhões de pássaros invadiram a cidade de Hopkinsville, Kentucky, resistindo aos melhores esforços para mantê-los longe.
Ninguém está rindo agora.”
Sim, criaturas noturnas leitoras do Café com Tripas, aprendam logo duas coisas: vocês não devem subestimar a vida útil deste blog, nem a periculosidade dos tomates!




Título original: Attack of the killer tomatoes!
Lançamento: 1978 (EUA)
Duração: 83 minutos
Direção: John de Bello






O ataque dos tomates assassinos

Essa doce arte de esculhambar



O ataque dos tomates começa de uma maneira bastante sugestiva: depois de contar essa historinha aí acima e mostrar uma pequena cena de terror (que, já que envolve tomates, não aterroriza ninguém), exibe os créditos do filme ao som de uma tarantela enquanto tomates são jogados contra a câmera e – subentende-se – contra o espectador. Na verdade, esse gesto simples poderia resumir todo o filme: um arremessa de tomates contra os nossos rostos bonitinhos, almejando informar, logo de início, que a historinha que ouvimos é balela, que não, sua comida nunca irá se tornar um monstro assassino, que tudo o que você está prestes a ver tem tanta graça quanto um vegetal (quer dizer, fruta) sendo jogada contra o rosto de alguém. Mesmo que seja o seu.
Essa falta de vergonha ao se assumir como um filme de esculhambação é a premissa sobre a qual toda a obra está apoiada, sendo que em nenhum momento ela pretende propriamente ser séria, diferentemente de outros trashs como O império das formigas, por exemplo. O arremessar de tomates esfrega na nossa cara que até os momentos em que a obra faz nítidas críticas contra a polícia, a política e outras instituições, elas são tão reais quanto monstros vermelhos gigantes que matam pessoas: estão ali para entreter; não sobrevalorize, você não está diante de um grande filme.
Deste modo, sendo uma obra que não se leva a sério demais, que só vai ser inteligente o suficiente para você não se sinta insultado, ela consegue ser um dos trashs mais coerentes e bacanas já feitos, não se apoiando sobre vulgaridades apelativas, insinuações sexuais toscas e outras coisas das quais o gênero frequentemente se vale, porém, ao mesmo tempo, não perdendo o tom exagerado e bizarro existente em qualquer bom trash.
Arriscando um palpite furado (aliás, como são todos os meus palpites) eu diria que O ataque dos tomates assassinos é, tal como A camisinha assassina e O massacre do micro-ondas, um dos melhores exemplos do que há de bom no cinema trash.
Bem-vindos a um tipo de cinema do qual você não vai apenas rir, mas que também rirá de você.

O que tem nesse molho?

Tomates assassinos começam a atacar cidadãos americanos em várias partes do país. Com isso, o governo quer encobrir a crise, os políticos ganharem com ela, os jornais vendê-la e assim por diante...

Como é?


Tomates assassinos tem uma estrutura que condiciona tanto o modo como a história é contada e como de que maneira as piadas são feitas. É o seguinte: em toda cena, ou em quase toda cena, algum “gatilho” cênico é disposto no cenário, pode ser o fato de que os personagens estão numa sala apertada, por exemplo, daí, ocorrerá que as piadas e o próprio desenrolar da história usem e abusem daquele artifício no seu desenvolvimento.
Basicamente, o humor filme é construído sobre essa estrutura, de modo que toda nova cena possui algo notável que chama a atenção do espectador e determina parte do humor que acontecerá ali. Na verdade, o próprio tomate é mais gatilho desse tipo mais que um elemento central do enredo, uma vez que, depois de assistirmos um pouquinho da história, percebemos que não há nenhum grande mistério por desvendar e, francamente, ninguém liga para o motivo pelo qual os tomates ganharam vida e saíram por aí atacando os estadunidenses, ou seja, a humanidade.
O que importa é que boas piadas são criadas nesse clima de non-sense e bom humor, levando o filme adiante sem que a gente espere muito dele e, com isso, tenhamos algumas boas surpresas de vez em quando.


Caricaturas


Do começo ao fim Tomates assassinos trabalha com caricaturas. Seus personagens até tem nomes, porém o que conta para a história não são suas personalidades, mas o fato de que eles são, sobretudo, jornalistas investigativos, políticos inescrupulosos, cientistas malucos e outros tipos caricatos que permeiam nosso imaginário. Assim, como não poderia ser diferente, toda a ação se dá nos Estados Unidos, país que, como sabemos, concentra a maior população de psicopatas, cientistas malucos, pessoas querendo apressar o fim do mundo e, agora, tomates assassinos do mundo. O filme não tem nenhuma vergonha na cara, como vocês podem ver e tudo isso é proposital.
Como consequência, o enredo segue diversos caminhos caricatos, toscos, dignos de um roteiro cujo começo, meio e fim seriam adivinháveis de tão clichê. Em certa passagem, por exemplo, as “autoridades” (olhem aí mais caricaturas) decidem usar tecnologia para criar, por meio do auxílio de seus super-cientistas, um soldado perfeito (Bruce!), que terminará com o problema dos tomates – adivinhem só – na porrada. Já em outra cena, a censura governamental sobre a mídia tenta encobrir o problema dos tomates, enquanto pessoas morrem de maneiras bárbaras, aparentemente impossíveis de disfarçar. No meio disso surgem personagens inusitados como a jornalista subestimada, o especialista em disfarce que resolve passar desapercebido se vestindo de Hitler (com um detalhe: ele é negro) e tantos outros que divertem bastante exatamente por forçarem a barra dentro de algo clichê, de onde não esperaríamos surgir nada de interessante. Ataque dos tomates acaba sendo um filme feito de caricaturas, sem personagens esféricos, melhor dizendo, com mais caricaturas que personagens, repleto de piadas e absurdos divertidos.
O filme consegue ser tão caricato nos assuntos que aborda – seja política, mídia, crise –, tão agressivamente falso que, no entanto, só pode pretender revelar a mais pura verdade. Nesse sentido acho que ele é muito interessante: exagera ao ponto de acharmos que aquilo não pode ser verdade, só para percebermos em seguida que só pode ser caricato se levar até as últimas consequências coisas que sabemos existir com certeza. Aliás, isso me lembra aquela cena clássica de The godfather:

Michael: Estou trabalhando para o meu pai agora. Ele está doente, muito doente.
Kay: mas você não é como ele. Disse que nunca seria como seu pai.

Michael: meu pai não é diferente de nenhum outro homem poderoso. Um homem que seja responsável por outras pessoas. Como um senador ou presidente.

Kay: como você é ingênuo.

Michael: por que?
Kay: Senadores e presidentes não matam pessoas.

A ironia da obra (das duas) é que, embora as caricaturas de presidente, senadores e mafiosos sejam distintas, a realidade deles é bastante próxima; tanto um quanto o outro recorrem a meios escusos para atingir seus objetivos. Nesse sentido é que Ataque dos tomates é um filme de caricaturas e ao mesmo tempo bem crítico delas, por mostrar em que aspecto algo é irreal, cartunesco, e mesmo assim completamente possível ou até atualmente verdadeiro.

Devo colocar tomates na minha macarronada?

Sim, senhor, senhora ou senhorita, pois seja lá quem você for, boas macarronadas só são feitas com tomates bem vermelhos. E se forem tomates mutantes assassinos, aposto que o gosto sai melhor ainda.
Ataque dos tomates é um filme bem simples e bem gostoso de assistir, o tempo vai passando e vamos acompanhando o desenrolar tosco dos acontecimentos com um sorriso no rosto. Ninguém vai engasgar de tanto rir, tampouco sair decepcionado com o que viu, sendo que a obra está entre os melhores exemplos, a meu ver, do que seria um bom filme trash: não se leva a sério demais, não deixa de ser esculhambação pura e inteligente desse mundo podre em que vivemos.
Com isso, o Café com Tripas mais que recomenda O ataque dos tomates assassinos: vejam sejam felizes.

Trailer

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