Você
tem uma/um namorada(o)/mulher/noiva(o)/marido/amante/peguete/ cabritinha ou
qualquer parceira(o) que você ama muito?
Já pensou no que você faria se ela(e) morresse
triturada(o) por um cortador de gramas? O quê? Como assim você nunca pensou
nisso?
Frankenhooker
Um Frankenstein rodando bolsinha na esquina
Frankenhooker é, de certo modo, uma releitura
oitentista (apesar de ser feito nos anos 90) do clássico Frankenstein,
entretanto, não pense que o filme é apenas mais uma tentativa de cópia e/ou algo
totalmente destituido de valor. “Frankenputa” consegue unir tanto certas
abordagens do clássico como também de problemas sociais presentes na época em
que o filme foi produzido - e claro... a trasheira que tanto amamos.
Título original: Frankenhooker
Lançamento: 1990 (EUA)
Duração: 85 minutos
Direção: Frank Henenlotter
Até que o cortador de grama nos
separe
Depois de ver sua namorada ser triturada por um
cortador de gramas, Jeffrey decide tentar reconstruir o corpo de sua amada com
pedaços de prostitutas e assim revive-la.
Frankenstein, Zorro, prostitutas, dorgas... Que
porra é essa?
Jeffrey é um eletricista que nas horas vagas faz
experimentos científicos que envolvem medicina, afinal quem nunca aprendeu na
internet (ops... naquela época nem internet direito tinha) como ser médico no
tempo livre, fazer redução de estomago na namorada e reconstruir cérebros
mecanicamente?
Enfim... Ele vai casar com Elizabeth, uma garota
gordinha que vive preocupada com seu peso, mas não consegue largar se vício – comida.
Ocorre que no dia do aniversario do seu sogro, ela é atropelada por um cortador
de gramas que ele mesmo modificou, estraçalhando todo o corpo da moça, restando
apenas a cabeça.
Com seus conhecimentos em medicina e
eletricidade, Jeffrey, decide dar uma de Dr. Frankenstein e reconstruir sua
amada, no entanto, para isso precisa de um corpo... E não qualquer corpo...
Se posso reconstruir minha namorada do jeito que
eu quiser, por que reconstruiria igual? Por que não a deixar mais gostosona?
Por que não criar a mulher perfeita? E pesando assim nosso protagonista vai em
busca de diversas prostitutas, de maneira a conseguir a melhor parte de cada uma...
Literalmente.
A mulher perfeita
Durante o filme percebemos a necessidade de
Jeffrey tentar reviver sua amada com um corpo perfeito, contudo, ele não busca
apenas um corpo sarado para colocar a cabeça de sua namorada, mas busca as
melhores partes de outras pessoas sem se importar com o que ele terá que fazer
para consegui-las.
Antes de Elizabeth ser triturada, o casal se
amava e o fato de que ela era gordinha não se tornava um empecilho para a
felicidade de ambos, por isso, por que revive-la com um corpo totalmente
diferente? Será que ele fez isso por ela que as vezes reclamava de sua forma?
Ou pra que tivesse uma mulher “mais” gostosa? Ou foi para satisfazer uma
demanda da sociedade?
Particularmente, eu chutaria dizer: os três...
É notável que Elizabeth é uma boazuda que utiliza
espumas dentro da roupa para aparentar que é mais cheinha, entretanto, mesmo
com os enchimentos não diríamos que ela é uma mulher gorda. Sendo assim, o
filme, de certa forma, brinca com essa questão da mulher perfeita, pois nos
permite ter uma visão bem diferente daquela da personagem.
Mesmo não aparentando para quem assiste, a
namorada de Jeffrey se sentia balofa e vivia escutando sua mãe falando sobre
seu corpo. Algo bastante semelhante com aquelas garotas que tem um corpo legal,
mas nunca estão felizes, sempre querem emagrecer mais e mais.
Essa visão gorda de si mesma da Elizabeth, a pressão
social sobre as gordinhas, e o aumento da busca por milagres emagrecedores pode
ser explicado pela ditadura da beleza (algo que já discutimos aqui em filmes
como Universidade do prazer e O vingador tóxico).
É o seguinte: nossa sociedade de certa forma
estabeleceu os conceitos de bonito e feio, com isso, a beleza tornou-se algo
padronizado e quase tudo que fuja desse padrão passa a ser considerado “feio”
ou “não belo”. As pessoas deixam de tentar ver belezas individuais e passa a
tratar a beleza por comparação: “essa mulher é cobiçada no filme, logo ela é
bonita”, “ela é modelo e magra e todos a desejam”, “essa é gordinha e está
encalhada na novela, logo ela é feia” e assim por diante. A partir disso as pessoas criam um padrão
mental de beleza, passando a julgar quase tudo com base nele e influenciando
aquelas pessoas fora do padrão a fazerem de tudo para que consigam se enquadrar
nele, mesmo que precise entrar na faca e se submeter a diversos incômodos.
Frankensteins modernos
Do mesmo modo que o Monstro de Mary Shelley era
um ser que representava a falta de contato com a sociedade e falta de referência
dos valores humanos, as criaturas das mitologias modernas partem na contramão,
são puras criações sociais. Nesse contexto começamos a encaixar uma das ideias
centrais do filme: a construção da mulher perfeita, que, na verdade, não passa
de um amontoado de peças sem vida.
Logo no inicio do filme percebemos que Jeffrey é
meio obcecado pela namorada, sendo que, mesmo depois de morta, ele faz jantares
românticos com a cabeça dela. Há, de fato, um sentimento de amor de Jeffrey
para com Elizabeth, porém, com o decorrer do filme, percebemos que esse amor
acaba sendo encoberto pela paixão verdadeira de Jeffrey, seu hobbie, a
“medicina bio-elétrica”. Bem dizendo, ele quer reviver sua amada, mas o
processo e a conquista de fazer algo único acaba parecendo muito mais
interessante que a ressurreição em si. Tanto é assim que, após sua morte,
Jeffrey faz de tudo para tentar revive-la, contudo 90% do seu esforço é voltado
para o corpo. Raramente notamos uma preocupação com manter a personalidade.

Podemos pensar em Jeffrey como uma representação
da “sociedade” e Elizabeth como a representação da mulher singular. No filme,
ele a quer bem, mas faz com que a moça se torne alguém totalmente diferente
fisicamente para preservar um valor que ele próprio respeita. Da mesma maneira na
sociedade as pessoas não querem, em última instância, mudar a personalidade das
demais, porém acabam bombardeando uns aos outros com imagens pessoas magras,
clinicas de estética, alimentos sem açúcar, e outras coisas que a sociedade crê como sendo boas ou modelares. Apesar disso, quando alguém consegue
mudar fisicamente para se adequar a isso, percebe-se que ela também não é a mesma e se tornou apenas mais
um produto daquele monte de informações sistematizadas.
Algumas garotas passam por um processo de
“Frankenstização”, ou seja, elas deixam de ser elas mesmas e passam a fazer de
tudo para ter o corpo de outras pessoas - maquiagens, lipos, plásticas... -
sendo que, no fundo, acabam se tornando algo sem vida, apenas uma reprodução
daquilo que foi idealizado por outros. E como já estamos cansados de saber,
algo idealizado funciona muito melhor nos sonhos do que na vida real.
Crackwhores
Algo bastante exposto no filme é a questão dos
vícios, percebemos que diversos personagens dependem de algo pra se sentirem
bem, não apenas drogas. Elizabeth, apesar de pouca participação, fala do seu
vicio de comer. No personagem Jeffrey podemos ver dois estímulos viciantes aos
quais ele responde sempre: o primeiro seria na própria Elizabeth, sendo fácil
notar isso por sua aparência perto dela e longe, no momento em que ele estuda
em seu quarto, reparamos sua aparência pálida e descontrolada, contudo,
assim que vai para o porão e pega a cabeça de Elizabeth sua fisionomia muda,
ficando mais corada e mais equilibrada;
um segundo estímulo seria a
furadeira do personagem - não entendeu? Eu explico: Jeffrey tem uma furadeira
e, sempre que precisa pensar melhor, ele a coloca na cabeça, fazendo um tipo de
lobotomia com a qual acelera seus pensamentos e chega mais rápido a solução de
problemas.
Eu acho que qualquer blog normal não diria isso,
mas como este aqui se chama Café com Tripas e lida
com gente meio perturbada, vou dizer: crianças, não tentem fazer isso em casa!
Voltemos ao filme. Um de seus pontos principais
são as “Crackwhores”, palavra que se refere a prostitutas que vivem para o
crack. Quase tudo aquilo que ganham com os programas é gasto com drogas, e
isso, muita vez, gera uma situação de submissão ao traficante. No caso do
filme, especificamente, também ao cafetão, um sujeito chamado Zorro (pelo nome
até já imagina o naipe do cara né? Bombado, tatoo, bigode, camisa aberta,
vários colares e um medalhão com um Z gigante no peito). É interessante notar
que todas as garotas que trabalham para ele tem um Z tatuado no braço, como se
indicasse propriedade, isto é, o viciado acaba sendo controlado pela droga e,
consequentemente, por aquele que controla a droga.
Sabendo disso, Jeffrey compra um pouco de crack
com Zorro e, por meio de seus conhecimentos científicos, cria um Super-Crack
que explode quem o utiliza. Sim, isso mesmo, você não leu errado: quando a
pessoa utiliza a droga ela explode como se tivesse fogos de artifícios dentro
de si.
Nosso protagonista se vale dessa droga para
conseguir aquilo que quer, as partes
perfeitas do corpo...
(Só acho estranho que ele vá matar as prostitutas
para roubar suas melhores partes e que, para tal, tenha a brilhante ideia de
explodi-las. QUE PORRA DE IDEIA É ESSA? Como ele sabe que não vai explodir a
merda do pedaço que ele quer? Não seria mais fácil mata-las sem explosões?
Não sou eu, é a droga
No filme, assim como na vida, fica bem aparente
que nessa questão dos vícios, independente qual estejamos falando, sempre há
aquele se prejudique e aquele que tire vantagens em cima disso. Tanto Zorro
quanto Jeffrey usam do vício das prostitutas para conseguir aquilo que desejam,
que no caso de Zorro é dinheiro e submissão das moças e, no de Jeffrey seus
corpos.
Sempre pensamos no vício como algo ruim, e de
fato é, mas, querendo ou não, há alguém por trás que está muito feliz com isso;
é só pararmos pra pensar nas industrias de cigarros que ganham em cima do
vício, nas igrejas que ganham em cima da fé, ou até mesmo as industrias de
estéticas que inventam milhões de “soluções milagrosas” para aquelas pessoas
que são viciadas em comida. Muitas vezes, essas mesmas pessoas que se
beneficiam, lavam as mãos quando são acusadas de gerar o problema do qual se
alimentam, afinal quem nunca escutou coisas como “eu apenas produzo, não obrigo
ninguém a usar”.
Isso é exposto bem nitidamente no filme, tanto
que, numa cena antes de Jeffrey drogar as prostitutas ele diz: “Eu não vou
matar ninguém, quem vai matar é o crack, logo, se alguém morrer a culpa não é
minha”, quer dizer, mesmo ele mesmo criando um super crack que exploda as
pessoas, recusa-se a aceitar sua culpa no processo.

Logo após que as prostitutas pegam as drogas
Jeffrey até tenta impedi-las, mas é a mesma coisa que falar para alguém em
abstinência “não cheira isso ai não que vai te matar”. Ele criou a situação e
colocou o vicio e o viciado no mesmo espaço, por mais que ele tente avisar,
isso não livra-o da culpa.
O filme não seria um tipo de representação da
sociedade então? Será que não somos todos Frankensteins construídos socialmente
para agir de acordo com aquilo que os empresários querem e passarmos a
acreditar que nossos vícios são questões pessoais e não influenciadas? Não
apenas drogas lícitas, contudo será que também não existe uma espécie de
marketing para as ilícitas? Não digo propagandas de tv, mas será que muitas
pessoas não usam apenas porque aquilo é ilegal e vai fazer dela uma pessoa
diferente e com experiências diferentes do comum?
É engraçado que tememos o monstro de Mary
Shelley, um ser construído sem valores e sem entender seu papel no mundo, que
tentava se relacionar com as pessoas, mas era mal compreendido; alguém que
deveria ser amado ao invés de temido. Entretanto, idolatramos todas as outras
criações que nasceram com vida embora preferissem se tornar vazias e dependente
de seu corpo para conseguir qualquer relação social.
A criatura do Dr. Frankenstein podia ser feia, porém
tinha muito mais valor que muitas criaturas bonitas que vemos por aí...
Devo explodir algumas prostitutas e criar a
mulher perfeita?
Claro que não leitor, prostitutas também são
pessoas como eu, você e sua mãe, além do mais, todos nós sabemos que essa
história de mulher perfeita é balela.
Frankenhooker é um filme obrigatório a todos os
fãs de cinema trash, ele traz uma ótima homenagem (sem perder a originalidade)
ao nosso querido monstro. O filme tem a essência dos anos 80 e tudo que nós
adoramos: peitcholas (pra quem gosta), um bombado de bigode e com cara de
poucos amigos (pra quem gosta), sangue, roteiro horrível porém ótimo, diálogos
sensacionais, prostitutas explosivas, mulher sendo triturada por um cortador de
grama, coisas sem noção como os jornais do filme que apresentam um jornalismo
quase tão ruim quanto o do Datena e uma monstra boasuda - quer mais o quê?
Se você não tem uma cabeça de ex-namorada aí na
sua casa para reviver, recomendo que vá ao primeiro site locadora e baixe
alugue o filme agora, antes que seja triturado por um cortador de gramas.
Trailer:
I ain't looking for no
head… From some fucking living dead
Dirty
ass Frankenhooker, got no class graveyard strutter
Espera
ai, não vai embora não. Antes de acabar com a postagem gostaria de postar um
música feita pelo “The 69 Eyes” baseada nesse clássico do cinema trash. A música
homônima fala um pouco da falta de classe da “Frankenputa” e da necessidade de
Jeffrey ter Elizabeth para ele de uma maneira um pouco mais rock n’ roll.
Pra
quem não conhece a banda, o “The 69 Eyes” é um grupo finlandês de “Goth n’
Roll” (Enfim, cada lugar classifica de um jeito, acho que isso resume melhor a
ideia) formada em 89, tendo moldado seu estilo conforme o tempo. No inicio havia
uma forte influencia do hard rock, mais tarde ela entrou em um clima um pouco
mais dark e hoje faz meio que uma mescla dos dois.
É
uma banda que provavelmente voltará aparecer logo logo no Café, pois tem bastante
influencia de filmes de terror, tanto que uma de suas musicas mais conhecidas é
uma homenagem ao clássico “Lost Boys”.
O
“69” é uma das bandas que eu mais escuto e gosto, então faz o favor de baixar
comprar todos os Cds da banda agora, aumentar o volume e gritar “DIRTY ASS
FRANKENHOOKER” junto comigo.
The 69 Eyes - Frankenhooker
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