quinta-feira, 3 de maio de 2012

Resenha: O dia dos mortos (Day of the dead)


Então você deseja um apocalipse zumbi? Uma enorme hecatombe na qual os fracos morressem e os fortes tivessem sua virtude testada? E você certamente vai estar entre os fortes, não é? Mas o que aconteceria depois da catástrofe - quando fosse possível sobreviver de modo razoavelmente seguro, com alimentação regular e até algum conforto -, o que você faria sem shoppings, internet ou família? Reconstruiria a civilização? Para quê? Para haver novamente miseráveis a quem explorar? Para sentarmos frente a televisão e rirmos de nossa própria burrice? Instalaria um sistema político que seus descendentes iriam deturpar e transformar em tirania? Ou desistiria? Tentaria apenas viver decentemente?

Seja qual for sua resposta, leitor, em “O dia dos mortos”, depois de muitos ataques zumbis, tiros e mortes, a esperança já escorreu pelo ralo. Restando somente algumas poucas pessoas e suas pretensões quanto ao futuro. Imediatamente lhes aparece a questão: afinal, o que fazer com a vida que nos resta?

Esta resenha faz parte de uma trilogia na qual comentamos os três filmes clássicos da “Dead series” do diretor George Romero, sendo eles: “Night of the living dead”, “Dawn of dead” e, agora, “Day of the dead”. Portanto, se quiser ler o restante basta clicar aqui (“A noite dos mortos vivos”) ou aqui (“O despertar dos mortos").



Título original: Day of the dead
Lançamento: 1985 (EUA)
Duração: 102 minutos
Direção: George Romero





“O dia dos mortos”
Viver num mundo despedaçado

Num mundo pós-apocalipse zumbi, Sarah é a única mulher num complexo laboratorial onde são realizadas pesquisas com mortos-vivos. Após a morte do último líder militar do recinto, o substituto passa a questionar as razões de se manter o local e os resultados das pesquisas feitas até então. No meio disso a protagonista tem que lidar com seu namorado surtado, cada vez mais fora da realidade, com um cientista obcecado por seus experimentos e com o fato de ser subestimada constantemente por seu sexo. Conforme o avançar do filme as relações entre os personagens (que já eram complicadas) vão se tornando ainda mais tensas. 
Que rumo toma a coisa?

O filme - contrariando boa parte do cinema que veio depois - não é centrado na ação, nas balas atravessando corpos, nos golpes abrindo crânios, no suco de tomate e ketchup jorrando veias a fora, ou em personagens e temas heróicos. Romero está mais interessado nos vivos que nos mortos. A trama se volta para o comportamento das pessoas em vista da situação desesperadora que experimentam e, não menos importante, para o questionamento do tempo, do sentido dado a ele. Não por acaso, a primeira cena mostra a personagem se confrontando com seu próprio tempo, materializado nas folhas riscadas de um calendário.
 Por um lado vemos personagens sobre intensa pressão, seja porque há zumbis famintos querendo devorá-los ou porque eles mesmos anseiam matar seus colegas; por outro, os próprios sobreviventes estão incomodados pela falta de perspectiva e de sentido na existência que dispõe. Afinal, se o mundo acabou o que devemos fazer com nossas vidas? Tentar reverter tudo ou simplesmente desistir? Se não há coação por parte do mundo - não precisamos de trabalho, bens, planos, impostos e podemos fazer o que quiser - a liberdade faz com que pese sobre o indivíduo as escolhas infinitas de que dispõe... E a o fardo desse peso ninguém está pronto para suportar. Indo ainda mais longe: se todas as coisas que “dão sentido a vida” foram embora, qual será a razão de vivermos daqui por diante? O que motivará nossas ações? Quem nos dirá que fazemos o certo ou o errado?
Legal, não é? Então corra para assistir, bobão...

Efeitos e trilha sonora
Os efeitos parecem hoje bastante engraçados, soando no melhor estilo do cinema trash; o que não chega tornar o filme alternativo, mas também não deixa de agradar essa rapaziada sedenta de sangue inserindo cenas bregas de beijos e amor (ugh...).
A trilha sonora é meio estranha, baseada nas baladinhas eletrônicas dos anos oitenta e efeitinhos sofríveis retirados de algum teclado Cássio velho. Em certos momentos ela não faz o menor sentido, nem para reforçar nem para ironizar as cenas, parecendo estar descolada da ação do filme. Porém, dado que Romero é provavelmente mais inteligente que eu (e você – afinal ele ficou rico não é?), ficamos em dúvida se a trilha é mesmo ruim ou se somos nós que não a entendemos...
O bom: a cena de abertura do filme é genial e mostra logo de cara porque esse não é mais um “filme de zumbi”.
O mal: o final de Rhodes é uma concessão desnecessária a obra.
O feio: Bub, o bizarro zumbi de estimação que virou um símbolo do mundo zumbi.
Vale à pena assistir?
 
Sim, o filme pode parecer superado porque foi tão copiado que sua originalidade parece ofuscada. Não é a obra máxima do diretor e, no geral, é apenas um filme razoável. No entanto vale à pena conhecer onde tudo começou. Nem que seja para notar que “The Walking Dead” não é assim tão inovador...

PS: em 2005 o filme recebeu uma “seqüência não oficial”... Ou trocando em miúdos: algum panaca ambicioso resolveu fazer um filme de zumbis e usar o nome “Day of the dead 2: Contagium” para angariar público e melhorar a publicidade do filme. Aconteça o que acontecer não assista – a película é uma ofensa ao cinema do Romero e a inteligência dos telespectadores.
PSII: como se já não bastasse a porcaria de 2005, a obra original ganhou um remake em 2008 pelas mãos do diretor Steve Miner. O filme é péssimo, com zumbis que saltam mais de três metros e que se esquivam de balas (juro pela santa-senhora-minha-mãe-que-está-no-céu). Mantenha distância.
PSIII: existe uma adaptação da obra para os quadrinhos (desculpem, mas não sei de que ano é) com o título em português de “Zumbi O despertar dos mortos”. Se você for um fã ardoroso, talvez queira conferir, mas aviso já: não é grande coisa...

Trailer:

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