segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Literatura: Hop-Frog (Edgar Allan Poe)


Hoje o Café volta a dar continuidade ao projeto #12MesesDePoe, deixando de lado a fantasia e o sobrenatural, o senhor bigodinho, no conto de hoje, vai nos provar que tamanho não é documento, o que importa é o jeitinho que você usa suas habilidades.  



            “Jamais conheci alguém que fosse tão vivamente dado a brincadeiras como o rei.
            Parecia viver apenas para troças. Contar uma boa história do gênero jocoso, e contá-la bem, era o caminho mais seguro para ganhar-lhe as boas graças. Por isso acontecia que seus sete ministros eram todos notáveis por sua perícia na arte da pilhéria. Todos se pareciam com o rei, também, por serem grandes, corpulentos e gordos, bem como inimitáveis farsistas. Se é a brincadeira que faz engordar ou se há algo na própria gordura que predispõe à pilhéria, nunca fui capaz de determiná-lo totalmente, mas o certo é que um trocista magro é uma rara avis in terris.”

Titulo original: Hop-Frog
Autor: Edgar Allan Poe
Ano: 1849
Lido em: Online (baixe aqui)
Paginas: 7
            Hop-Frog e Tripetta, são anões que foram sequestrados de sua terra natal para serem oferecidos de presente para um Rei. Hop-Frog além de anão também era manco, característica que lhe rendeu esse nome, isso fez com que servisse de bobo para o rei e para os sete membros do conselho, assim como Tripetta que, por ser uma ótima dançarina, também tinha como função entreter seus senhores. Quando o rei decide dar uma festa e pede conselhos de fantasias para o seu pequeno servo, o bobo vê a oportunidade perfeita para se vingar.

Reis & Servos

            Hop-frog é uma história simples, mas que dentro de seu curto espaço discute bem a questão do poder, seja o do rei, que detém de riqueza e influência, seja daqueles que se mostram mais inteligentes.
            Nos primeiros parágrafos somos apresentados a um rei que tem como grande característica o seu gosto pelas brincadeiras e piadas, o que faz com que leitor crie certa simpatia por ele no início. Mas é só avançarmos um pouco na leitura que esse humor do rei se mostra um tanto deturpado e inconsequente, já que ele está interessado apenas no próprio entretenimento, sem se preocupar com os custos e com os danos que possa causar. Isso fica aparente quando os anões surgem na história porque, apesar do rei ser uma pessoa que quer estar sempre rindo e fazendo brincadeiras, ele não se importa em ter servos em condições precárias ou mesmo em maltratar e caçoar da deficiência alheia, algo que por sua vez levanta a questão sobre o limite do humor, mostrando que uma piada pode ser consequência de muito sofrimento.
            Outro ponto que aprofunda essa questão do riso a partir da dor alheia é que tanto o rei quanto seus ministros são descritos como pessoas feias, sem muita educação e sem muita inteligência, apesar de serem considerados bonitos em seu reino. Reflete-se assim a hipocrisia do monarca que tira sarro do outro sem perceber os próprios defeitos porque está protegido pelo poder, que o torna capaz de legitimar sua repugnância. Apesar do poder criar sua beleza, contudo, ele não compensa a falta de inteligência: a fantasia designada para o rei e seus conselheiros no final do conto não parece mera coincidência.

Narrador?

            Algo que deixou intrigado durante o conto foi seu estilo narrativo, pois apesar dele parecer uma narrativa em terceira pessoa, em alguns momentos me perguntei se na verdade não seria primeira. Por ser um narrador desconhecido, uma das poucas coisas que é possível supor sobre a seu respeito é que ele é contemporâneo à história por falar frases como: “Nosso rei” e “Jamais conheci alguém que fosse tão vivamente dado a brincadeiras como o rei”. Ao dizer frases assim ele suscita dúvidas no leitor, pois o modo pelo qual eventos são contados geralmente dá a entender que o narrador é onisciente, já que ele sabe não apenas o que houve na festa como também os acontecimentos que ocorreram no gabinete do rei. É possível supor então que quem está nos contatando a história seja na verdade o próprio Hop-Frog ou a Tripetta, porque apenas eles estavam presentes. Mas existe ainda outra possibilidade: o narrador pode estar supondo os acontecimentos da sala do rei a partir do que houve na festa, tornando-o um narrador não confiável. Ou pode ser o próprio Poe se colocando como narrador da sua criação.

O anão PoeRneta

            Neste conto, Poe adota uma narrativa mais realista e linear, sem apelar para o sobrenatural ou questões filosóficas e psicológicas. Mesmo sendo um sobre vingança, tema já saturado na literatura, ele consegue se manter diferente de todo o resto, conseguindo gerar a dúvida sobre a origem do narrador mesmo em uma história que parece fechada, assim como tratar de temas ainda relevantes. Apesar de não ser um conto muito conhecido de Poe, Hop-Frog mostra que mesmo os menos celebrados merecem ser lidos.

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