O Café com
Tripas retorna com uma resenha literária para prender os leitores na
cadeira e fazê-los presenciar assassinatos brutais diante de seus olhos.
Esqueça monstros do armário, objetos assassinos e os unicórnios zumbis, hoje o
monstro se esconde dentro de pessoas reais.
Será que você conseguirá decifrar a origem da
maldade humana após ficar cara a cara com o sorriso da hiena?
"O problema das pessoas é que elas só constroem muros do lado de
fora. O mal consegue atravessar o concreto."
Titulo original: O sorriso da hiena
Autor: Gustavo Ávila
Ano: 2015
Editora: Independente
Paginas: 304
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David, uma criança de 8 anos, está amarrado na
cadeira observando seus pais presos na mesma situação. Um homem se aproxima de
seu pai, com um alicate segura sua língua e a corta com uma faca. Enquanto seu
pai engasga com o próprio sangue, o assassino se aproxima e dá um tiro na
cabeça de sua mãe.
Anos mais tarde, David ainda perturbado pelos acontecimentos
da infância decide repetir o mesmo que aconteceu com ele em outras crianças e
assim tentar compreender os processos do trauma. Mas para isso ele precisará
convencer o renomeado psicólogo William a ajudá-lo a desenvolver seu estudo
sobre a maldade humana e, ao mesmo tempo, não deixar que o detetive Artur se
aproxime das pistas.
O psicopata, o psicólogo e o
detetive
É sempre um prazer o Café
recomendar coisas de qualidade (ou coisas sem qualidade que são boas) para os
leitores desse bloguinho sujo e mequetrefe, mas é muito melhor quando
compartilhamos obras de qualidade produzidas aqui mesmo em terras tupiniquins,
que mostram cada vez mais que, apesar dos pesares, temos pessoas fazendo
trabalhos incríveis por aqui. Sim, eu sei que geralmente essas obras ficam meio
escondidas e longe dos best-sellers, porém é justamente por isso que temos esse
espaço, para recomendar tudo aquilo que não aparece no programa do Gugu para
aqueles leitores desvirtuados que nos acompanham.
O sorriso da hiena é um romance policial que parte de uma premissa diferente da
grande maioria. Desde o inicio sabemos quem é o assassino e suas motivações,
contudo, em nenhum momento isso se torna um empecilho para a trama – pelo
contrario: a cada capítulo ficamos ainda mais curiosos quanto ao desenrolar da
história dos três personagens. Outra característica interessante da obra: não
temos um personagem principal. A narrativa é construída de modo que o leitor
acompanhe cada personagem, mostrando as perspectivas e os anseios individuais
de modo que a historia flua por três visões diferentes.
Como se trata de uma obra nacional, o leitor tem
certa familiaridade com as situações que acontecem no decorrer da história. Por
exemplo: o local onde a trama se passa, apesar de não ser mencionado (pelo que
me lembro), é muito próximo da realidade de algumas capitais brasileiras, além
disso, também a ambientação, a rotina, a reação de alguns personagens, ou mesmo
certas questões sociais e políticas apresentadas ali, produzem no leitor a
mesma sensação de familiaridade.
*
O grande mérito do livro talvez seja não se
limitar à historia, e sim explorar mesmo que nas entrelinhas questões
importantes que deixam o romance ainda mais rico. Sim, é um romance policial e
tudo gira em torno da investigação de um assassino que reproduz com crianças
aquilo que ele sofreu quando tinha a mesma idade, mas, apesar de ser isso que
está na sinopse da parte de trás do livro, o real assunto do livro é a moral.
Não apenas aquela do psicólogo, mas também a dos outros personagens da
história. A linha que divide o bem e o mau, certo e o errado, justo e injusto
está sendo borrada em cada entrelinha do livro.
William diversas vezes se justifica dizendo que
está usando o mal pra fazer o bem e convencendo de que é apenas uma vitima da
situação e que a faca não está em suas mãos. Mas até que ponto isso é verdade?
O que diferencia o psicólogo do assassino sendo que ambos, apesar dos pesares,
acreditam que os assassinatos trarão frutos positivos e ambos utilizam disso
para uma realização própria?
Tanto essas quanto outras questões vão permear a
história, entretanto, O sorriso da hiena é um daqueles livros que é
melhor não falar muito para não estragar a experiência.
Edição
O sorriso da hiena foi lançado
independentemente, sem o suporte de nenhuma editora. Portanto, não é possível
encontrar o livro físico nas livrarias (apenas formato digital), caso você se
interesse, é possível conseguir uma copia no site oficial da obra, onde o
próprio autor divulga e vende por conta própria.
Por não ter nenhuma editora por trás, é possível
perceber uma certa simplicidade no livro. Apesar de não ser perfeita, ela é uma
edição justa, com qualidade e com características superiores a livros de muitas
editoras grandes. A começar pela capa que apesar de simples é muito bonita e
chamativa (no bom sentido), e com apenas três cores e duas imagens consegue
representar o espírito e a ideia central do livro.
A diagramação e a formatação do texto é bem
feita e ajuda a leitura e o papel possui uma tonalidade meio creme que evita o
reflexo da luz, melhorando a leitura.
No geral, o livro físico é honesto, melhor do
que o esperado para um livro independente. Aquilo que poderia ser melhor não
passa de detalhe e não interfere no texto em si. Por exemplo: a parte traseira
poderia ser melhor trabalhada, e também seria interessante um breve resumo sobre
autor no final do livro.
Obs: O livro que comprei no site veio com uma
dedicatória do próprio autor, algo que achei bem legal, demonstrando um carinho
de olhar quem comprou e agradecer, e não simplesmente embalar e enviar como uma
loja qualquer.
Devo ajudar Artur a ir atrás do
assassino?
Sim, O sorriso da hiena é um livro bem
escrito e fluído, que consegue se manter consistente do inicio ao fim e mantém
o leitor mais interessado a cada capitulo que passa. Além da premissa, a obra
também aborda temas interessantes que levantam discussão sobre a moralidade dos
atos e sempre representa os seus personagens de forma humana, sem apelar pros
estereótipos de bem e mal.
Apesar de eu ter um sentimento conflituoso
quanto ao final, por ser algo totalmente diferente do que eu esperava, é um
desfecho coerente e que surpreende. Não entrarei em mais detalhes para não
estragar as surpresas e a leitura.
Assim, a obra de Gustavo Ávila é uma ótima
recomendação pra quem se interessa não apenas por romances policiais e histórias
sobre serial killer, mas também por discussões morais e psicológicas sobre a
“construção do mal”. É o tipo de leitura que você se sente feliz por saber que
foi produzida por um autor nacional e que, ao ler, você está, de certa forma,
contribuindo para que novas obras e autores brasileiros ganhem espaço em um
ambiente tão dominado por best-selleres de qualidade duvidosa.
Caso tenha interesse em saber mais sobre o livro ou comprá-lo:
www.osorrisodahiena.com.br
mt bom!
ResponderExcluirValeu!
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ResponderExcluirNão remove não, a gente quer ler seu xingamento também.
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